O conceito e a sua interpretação
Noiserv tem escolhido para as suas últimas músicas títulos longos que contam desde logo uma história, muitas vezes diferente da história que a própria música narra. Nesta composição visual optei por focar todo o seu conceito no título da música escolhida: “This Is Maybe The Place Where Trains Are Going To Sleep At Night”. Procurei que a capa o retratasse. Surgiu-me logo a ideia de fotografar a Estação do Porto-Campanhã, já que por ser tão grande e tão sossegada retrataria de forma exímia o pretendido.
A bolacha foca-se no “maybe”, procurando mostrar o que de facto acontece na realidade. Se por um lado a capa é talvez o sítio onde os comboios dormem, por outro lado na bolacha vemos o sítio onde as pessoas dormem e inclusivamente uma pessoa a dormir.
Ambas as composições são calmas, o que remete para a sonoridade da música também ela calma e tranquila, como todas as músicas do autor em questão.
Há um contraste evidente entre a capa e a bolacha em todos os sentidos. Se por um lado a capa nos mostra a fantasia, usando o monocromático, encontrando-se realidade apenas na perspetiva, por outro lado a bolacha pretende expor a realidade acerca do tema. Neste sentido é evidenciado que dormir é da competência das pessoas, os comboios andam. Daí o contraste existente na própria bolacha entre o movimento do comboio (visível através da janela) e a monotonia da pessoa. Numa tentativa de evidenciar que se trata do interior de um comboio é ainda colocado a textura caraterística do seu banco. Esta textura remete exatamente para o sítio onde as pessoas dormem, já que é nos bancos que o fazem.
Em conclusão, as composições transmitem o contraste entre a fantasia demonstrada pelo sítio onde os comboios dormem à noite (“This Is Maybe The place Where Trains Are Going To Sleep At Night”) e a realidade demonstrada pelo sítio onde as pessoas dormem nos comboios, evidenciando assim que são elas quem tem aptência para dormir mostrando o outro lado do “maybe” de que nos fala o título da música escolhida.
Elementos básicos de Comunicação Visual
“Podemos analizar cualquer obra visual desde muschos puntos de vista; uno de los más reveladores consiste en descomponerla en sus elementos constituyentes para compreender mejor el conjunto.”
–– Dondis, 1994
• PONTO
O ponto está presente em ambas as composições, embora seja na bolacha que se note mais a sua presença. Nesta, o ponto ocupa um lugar primordial. O fundo da composição é constituído por pontos pretos dados pela textura do estofo. Os pontos dispõem-se de forma padronizada criando textura, elemento a realçar posteriormente. É importante ainda realçar a presença das manchas coloridas conseguidas por conjuntos de pontos unidos, que constituem pequenas formas assimétricas. São estas formas que permitem identificar o estofo como o estofo do comboio - fulcral para a compreensão da mensagem que se pretende transmitir.
O ponto é ainda destacado na capa. Estão dispostos vários pontos de forma aleatória no canto inferior direito bem como um pouco por toda a composição, conferindo assim textura à imagem.
• LINHA
O elemento que se destaca na composição da capa é indubitavelmente a linha. Desde a linha do comboio, ou as linhas que a desenham, até às linhas das janelas do edifício que aparece à esquerda. A linha é o elemento base da capa, transmitindo tranquilidade e estabilidade.
Também na bolacha este elemento é reconhecido: a linha aparece na metade esquerda do círculo confirmando o movimento. É portanto com o auxílio da linha que se consegue o contraste entre as duas metades do círculo – por um lado, o movimento e por outro a monotonia.
• CONTORNO
A linha férrea, o sinal de trânsito ferroviário e os postes no quadrado são contornos assim como o contorno da janela no círculo. Este último divide a imagem em duas partes, as tais duas metades do círculo já referidas.
• DIREÇÃO
A direção está muito presente em ambas as composições, visto que têm presentes a linha, tal como afirma Dondis quando os pontos estão tão juntos que não se consigam distinguir individualmente aumenta a sensação de direção (1994). No quadrado, as linhas afunilam da esquerda para a direita ainda que não cheguem a um fim. O facto de essas linhas serem diagonais transmite estabilidade. Na bolacha a direção está presente na metade esquerda do círculo ilustrando o movimento do comboio enquanto a rapariga dorme.
• TONALIDADE
A imagem da textura do banco do comboio confere à composição da bolacha tonalidade. Já o monocromático da capa representa um mundo que não existe, uma vez que é minha intenção que se perceba que não existe na realidade nenhum sítio onde os comboios dormem à noite.
• ESCALA
Na bolacha a escala chega-nos de forma evidente através da sobreposição de duas fotografias. A transparência da fotografia da menina a dormir permite que a textura do banco seja realçada. A textura está aumentada já que a sua identificação é fulcral para a compreensão da mensagem. Também na capa se observa escala que trás para a frente da composição as partes da imagem a destacar por serem de maior dimensão e relega para último plano as casas e outros contornos de menor importância para a perceção da mensagem que se pretende transmitir.
• DIMENSÃO
A dimensão é conseguida em ambas as composições graças à perspetiva que confere às imagens uma certa realidade, já que se pretende mostrar uma visão do mundo dimensional.
• TEXTURA
A textura é um elemento que tem vindo a ser descrito ao longo desta análise. A textura do estofo é a textura mais importante deste projeto, espera-se que esta se reconheça logo à primeira vista para que seja associada ao sítio onde as pessoas dormem. Também há textura na capa: nos carris e no chão do lado direito. Esta enriquece a composição.
• MOVIMENTO
O movimento aparece, como já foi dito, na metade esquerda do círculo para evidenciar exatamente o movimento do comboio, procurando assim transmitir a mensagem.
Técnicas de Comunicação Visual
• EQUILÍBRIO
O equilíbrio é a técnica de comunicação visual mais importante (Dondis, 1994). Este verifica-se na composição da capa e foi conseguido graças às linhas diagonais que transmitem estabilidade (Dondis, 1994).
• ATIVIDADE
A atividade surge do movimento na janela do comboio. Nota-se que o comboio está em atividade, contrastando com a passividade da restante metade da imagem.
• PASSIVIDADE
O equilíbrio absoluto da técnica de representação estática apresenta um efeito de repouso e tranquilidade (Dondis, 1994). Essa tranquilidade é especialmente visível na composição que integra o quadrado.
• NEUTRALIDADE
A neutralidade é conseguida pelo ambiente de uniformidade que transmite a paisagem da capa.
• TRANSPARÊNCIA
Na bolacha foi utilizada a técnica de transparência tendo-se incluído detalhes visuais através dos quais se pode ver o que se encontra por detrás do que se apresenta (Dondis, 1994). Em termos práticos, pode observar-se transparência na fotografia na menina a dormir pelo que é possível ver a fotografia da textura.
• PROFUNDIDADE
A existência de perspetiva remete desde logo para a profundidade já que é esta que distingue o profundo do plano (Dondis, 1994). Assim sendo existe profundidade em ambas as composições.
Material utilizado
A base deste projeto foi a fotografia. Foram utilizadas três fotografias tiradas com recurso a uma máquina reflex.
As fotografias foram editadas no Adobe Photoshop. Na fotografia da capa utilizou-se a ferramenta Threshold. A imagem foi divida em duas partes, isto é colocou-se a imagem em duas layers, tendo sido em cada uma delas editada de forma distinta: numa procurou-se evidenciar a metade inferior da fotografia e na outra a metade superior. Apagou-se com recurso à borracha a metade que não se evidenciou em cada uma das imagens. Por fim diluíram-se as layers em apenas uma, ficando assim com ambas as partes evidenciadas numa só imagem. Na composição da bolacha usaram-se duas fotografias. A fotografia de fundo corresponde à textura do estofo do banco do comboio. Nesta foram em primeiro lugar feitas correções a nível da cor, tendo-se intensificado o vermelho. A cor da fotografia da menina a dormir no comboio foi reduzida a uma escala de cinzentos, colocando os tons amarelos com maior luminosidade, o que fez com que a imagem ficasse mais clara. Isto com o objetivo de que a imagem de fundo se fizesse notar melhor aquando a sobreposição. Por fim, colocaram-se as duas layers visíveis reduzindo-se a opacidade da layer que se encontrava por cima – a fotografia da menina a dormir – para 45%.
Depois da edição no Photoshop as fotografias foram enquadradas nos dois contornos básicos da comunicação. A capa foi enquadrada num quadrado com 12cm de lado e a bolacha num círculo com 11,5cm de diâmetro com um buraco de 1,5cm de diâmetro. Este enquadramento foi feito com recurso ao Adobe Illustrator.
Bibliografia
Dondis, Donis A. (1994), La Sintaxe de la Imagem, Introducción al Alfabeto Visual, Ed. GG Diseño, Barcelona
